segunda-feira, 12 de maio de 2014

ciência para crianças

Educadora sugere livro de psicólogo americano que traz dicas sobre como ensinar ciência para crianças. Segundo o autor, o conhecimento deve ser apresentado de forma sutil, divertida e não intrusiva.
Por: Vera Rita da Costa
Publicado em 08/05/2014 | Atualizado em 08/05/2014
Em famíliaA ciência na infância deve ser apresentada com prazer, despertando o interesse e a motivação, componentes indispensáveis à aprendizagem. (foto: Stephen Eastop/ Sxc.hu)
Passear por livrarias ainda pode trazer gratas surpresas. Na semana passada, por exemplo, tendo em mente ainda a discussão sobre as contribuições que os pais podem dar aos filhos em termos de aprendizagem em ciências apresentada aqui, me deparei com um livrinho precioso, escrito pelo historiador da ciência Michael Shermer. O título é Ensine ciência a seu filho, mas o subtítulo que o complementa é ainda mais estimulante: ‘Torne a ciência divertida para vocês dois’ (JSN Editora, 2011).
Se você é pai/mãe interessado/a nessa questão ou professor/a de ciências, vale a pena investir nessa aquisição.
Michael Shermer também é pai, o que lhe dá a oportunidade de "testar suas ideias em sua filha" 
Além de historiador de ciência, Shermer é psicólogo experimental de formação e fundador da Skeptics Society  e da Skeptic Magazine, o que dá às suas ideias sobre o que é e como ensinar ciências um tom muito especial. Shermer também é pai, o que, segundo ele próprio revela no livro, lhe dá a oportunidade de testar suas ideias em sua filha – sem, é obvio, “considerá-la um rato de laboratório”, ironiza.
Entre as muitas dicas que Shermer dá sobre educação e, em particular, sobre a educação para a ciência, logo se destacam algumas preciosidades – e, como é do estilo do autor, sempre acompanhadas de muita crítica.
Diz Shermer, já na introdução de seu livro, que a ciência na infância deve ser apresentada de forma sutil e não intrusiva, sem se pressionar os filhos nem introduzi-los em programas educacionais ditos avançados, que prometem conferir-lhes vantagens iniciais ou garantir o acesso à universidade o mais precocemente possível.
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Os pais devem apresentar a ciência a seus filhos de maneira lúdica e desafiadora, como algo que, de fato, ela pode ser: divertida. (foto: Michael & Christa Richert/ Sxc.hu)
“Que diferença faz alguém obter o diploma aos 21 ou 22 anos, ou se formar em medicina aos 28 ou 29? Nenhuma, a menos que seu filho não estivesse pronto quando você o orientou na carreira escolhida, e, se isso aconteceu, seus planos podem dar errado de qualquer forma. Talvez seu filho não esteja pronto e experimente uma quantidade excessiva de fracassos e correspondentes frustrações. Nesse caso, ao pressioná-lo, você na verdade o está atrasando”, pondera o autor.
Em outras palavras, Shermer procura alertar os pais para uma tendência que também pode ser encontrada no Brasil em uma parcela (mais abonada) da população: escolher a escola e matricular o filho na pré-escola já preocupados e cheios de expectativas em relação ao vestibular.
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O objetivo primordial não é ensinar às crianças ‘o que pensar’, mas ‘como pensar’ – cientificamente. (foto: Sxc.hu)
“Essa escola prepara para o vestibular?” é a pergunta-chave que norteia a escolha da escola em muitos casos, sem que se tenha a preocupação também com outras dimensões da educação, como o prazer em aprender e até de frequentar o ambiente escolar.
“A última coisa que quero fazer como pai é empurrar a ciência goela abaixo de minha filha até que essa seja a última coisa que ela queira estudar na escola”, diz Shermer.
A última coisa que a parcela da população brasileira que pode escolher a escola de seus filhos deveria fazer é empurrar acriticamente um determinado tipo de escola goela abaixo de seus filhos
Fazendo nossas as palavras do autor e adaptando-as à realidade brasileira, bem poderíamos dizer: a última coisa que a parcela da população brasileira que pode escolher a escola de seus filhos deveria fazer é empurrar acriticamente um determinado tipo de escola (conteudista e voltada a um ultrapassado modelo de vestibular) goela abaixo de seus filhos, de forma a obter resultados que podem ser justamente o contrário do desejado – o desprezo pelo aprendido e o desprazer em estudar.
Como psicólogo, Shermer sabe que o prazer é um grande aliado do interesse e da motivação, e que esses dois componentes, por sua vez, são indispensáveis à aprendizagem. Por isso, aconselha em seu livro que os pais apresentem a ciência a seus filhos de maneira lúdica e desafiadora, como algo que, de fato, ela pode ser: divertida.

Um jogo para entender o mundo

Embora a ciência possa à primeira vista e ao leigo parecer difícil e intimidadora, Shermer defende que ela não trata apenas das coisas, mas é também “pensamento”. A ciência, diz ele, é “um jogo para entender o mundo, jogado segundo regras especiais”, que envolve habilidades de pensamento a serem desenvolvidas e o exercício de determinados valores.
O objetivo primordial não é, portanto, ensinar às crianças “o que pensar”, mas “como pensar (cientificamente)”, defende ele.
Veja no quadro a seguir um resumo e adaptação das ‘regras’ do jogo da ciência que Shermer indica em seu livro para serem ensinadas às crianças. Perceba que a maior parte dessas regras representam habilidades e valores. Ou, como diz o autor, “umas poucas habilidades básicas de pensamento”, a serem “adquiridas de maneira prática”.
Se gostar das regras, comece a praticá-las. Certamente, mal não vão fazer a seus filhos ou alunos. São regras que só admitem benefícios.

As regras do jogo da ciência

Regra 1 – Honestidade é a melhor políticaÉ preciso ser íntegro e honesto. Não se pode trapacear nesse jogo e deve-se se esforçar para que tudo seja feito corretamente. Tenha consciência de que suas afirmações e resultados vão ser testados e repetidos por outros. Sua reputação nesse jogo, portanto, depende de sua honestidade.
Regra 2 – É proibido trapacearNão se podem forjar resultados. Expectativas até participam desse jogo, mas suas crenças, esperanças e desejos estão fora.
Regra 3 – Não aceite a palavra de outra pessoa – verifique você mesmoDuvide. Para responder suas próprias perguntas, não se baseie em argumentos de autoridades nem em verdades estabelecidas, por tradição ou mito.
Regra 4 – Use descobertas anteriores para melhorar o jogoAceite a mudança. As regras do jogo permanecem, mas aquilo que com ele se produz, inclusive o conhecimento, muda e melhora com o tempo.
Regra 5 – Tente encontrar respostas ‘naturais’ para as perguntasBaseie-se em observações e no uso dos sentidos. Diante de afirmações, busque explicações naturais, deste mundo (não sobrenaturais).
Regra 6 – Resolva discussões com evidências, não com insultosNeste jogo as discussões são positivas, baseadas na argumentação e na apresentação de dados e evidências, obtidos por observações, testes e experimentos. Não há censura, desrespeito pela opinião alheia ou ataques pessoais.
Regra 7 – Não considere nada certoNada pode ser afirmado como certeza ou provado. Há coisas prováveis e muito prováveis, mas 100% não existe nesse jogo.
Regra 8 – Não há segredosDivulgue seus resultados, compartilhe com os outros jogadores o que fez, como fez e os resultados obtidos. Contar uns aos outros o que estão fazendo só melhora esse jogo.
Regra 9 – Admita seus errosErrar é possível neste jogo. O importante é admitir e corrigir o erro, aprendendo com eles. Também se pode mudar de opinião, quando novas evidências se apresentam.

Vera Rita da Costa
Ciência Hoje/ SP

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